Friday, February 08, 2008

Contos de Escalada

Escalador 2

(parte 4)


A barraca quase encostava o teto sobre os dois corpos deitados imóveis, o vento matinal castigava e mesmo assim ninguém se movia. Somente algumas horas depois, o zíper da barraca foi aberto, a pequena quantidade de calor que circulava dentro da barraca foi expelida com muita rapidez. Com movimentos decididos e marcados, os dois homens faziam os últimos preparativos antecedentes à escalada.
No primeiro dia de escalada eles avançariam trezentos metros de parede, que era um misto de rocha sólida e gelo. Após alcançarem esta altitude, chegariam em um grande platô onde poderiam dormir. Podendo assim, no próximo dia, subir mais trezentos metros inéditos para eles e no último dia, terem vinte e quatro horas para se dedicar aos tenebrosos cem metros restantes. Tudo foi calculado com muita exatidão para o último dia de escalada da dupla coincidir com o da chegada do trio de escaladores a base do paredão.
O início da escalada foi bastante tranqüilo, devido a boa consistência do gelo e pelo fato de não envolver muitas decisões arriscadas. A preocupação maior, no primeiro dia, era com o último trecho, que era a linha de acesso ao platô. Formado por uma fenda levemente transversal e negativa, aquele era um momento de pura concentração para a dupla. Em alguns pontos a fenda se estreitava ao máximo impossibilitado uma progressão através dela, sendo necessário o uso de ascensão através de lacas soltas ao lado da fenda.
Iuri um grande conhecedor da escalada artificial, logo quando decidiram escalar aquela via, antes de qualquer palavra de seu colega, destacou que iria guiar esta tão famosa cordada que antecedia o platô. Satisfeito com a possibilidade de escalar este desafio se preparou rapidamente.
Começou a fenda utilizando algumas peças médias para prosseguir e depois de alguns metros obrigatoriamente as peças diminuíram de tamanho, consideravelmente. Certo ponto da subida levou ao seguinte pensamento: “Nossa, essa é a última peça que colocarei na fenda...”
Ficou olhando para o último mecanismo que teria de colocar dentro da fenda para depois ter que fazer uma progressão fora dela. A distância para chegar a parte superior da fenda onde seria possível a progressão por ela novamente era considerável e isso assustava o escalador. Qualquer descuido naquela situação iria acabar fatalmente com a conquista e talvez com o próprio escalador, pois a queda seria muito brusca somada com um impacto contra a parede. O último encaixe da peça na fenda foi minucioso.
Jorge bem abaixo cuidava da segurança do amigo de forma apreensiva. Apenas estava ali para que o corpo de seu amigo não sumisse no vazio. O som do vento forte deixava a cena do escalador que estava sobre ele um tanto monótona aos olhos de qualquer pessoa que não estivesse na situação de seu amigo. Jorge sentado em uma pequena saliência na pedra, apenas pensava que aquela agonia toda poderia ter sido aliviada com um desvio por uma outra via, que para eles iria tomar apenas doze horas de escalada.
A progressão de Iuri era mais lenta que o normal. Cada cliff colocado sobre uma placa de pedra quase solta da parede causava-lhe mais angustia. Realmente o que haviam falado sobre esta parte da escalada era real. As agarras naquela parte eram realmente podres e assustadoras, porém, certamente Iuri já havia se deparado com outras centenas de lacas bem piores em outras escaladas. Mas, a atual situação deixava tudo um pouco mais devastador com o que parece.
A fenda novamente poderia ser vista de forma confortante. Acima de sua cabeça seria colocada novamente uma peça que lhe transmitia segurança. Esticou a mão para o alto segurando um quadrado de metal em direção ao começo da fenda em uma tentativa inútil. Faltavam apenas três centímetros para encaixar a peça. Puxou mais uma vez seu corpo contra a parede na tentativa de por algum milagre conseguir a progressão, nada...
Com o auxílio de uma outra peça idêntica conseguiu alcançar a fenda e o alívio foi imediato. Ouviu ao longe o som de gritos e concluiu, ao olhar para baixo, que eram vivas de seu amigo.
Minutos depois chegou ao platô. Seu coração bombeou com mais força o sangue para seu corpo frio, ele estava precisando vencer um desafio destes para motivar ainda mais a sede de dominar aquela parede. Não demoraram muito e tudo estava pronto para o horário de descanso. Recolheram algumas informações sobre o clima da região através do telefone por satélite. Foram informados que uma tempestade iria apanha-los. Mesmo assim, entre as comemorações por terem sobrevivido ao primeiro dia, optaram por resistir a tempestade na parede, nada de descer e perder mais tempo a não ser o necessário.
A noite foi longa para ambos. A proximidade da tempestade estava eminente, levando os dois escaladores a se abrigarem atrás de um grande bloco alojado sobre o platô. Jorge com a cabeça apoiada em algumas pedras dormiu com o pensamento que enfrentar uma tempestade não seria um contratempo, pois a rapidez era o ponto forte daquela subida. Iuri estava com a cabeça longe daquela noite incomoda, seus pensamentos estavam voltados para projetos e outras preocupações paralelas ao mundo da escalada.
O escalador que por último dormiu, chacoalhou o parceiro na tentativa de acorda-lo. Este resmungando balbuciou algumas palavras incompreensíveis, ao mesmo tempo que tirava de baixo de suas próprias costas um pedregulho que o incomodou a noite toda.
Jorge acordou antes de Iuri com a intenção de escalar mesmo sobre a péssima condição climática que envolvia o amanhecer do dia. Enfiou garganta a baixo três barras de cereal, animou o colega para começar o dia de escalada e subiu parede acima. Tudo isto seria normal se acompanhado de tudo isso não estivessem rugindo rajadas de vento muito fortes. Jorge mesmo contrariando a vontade do seu amigo de esperar a passagem da tempestade no chão, resolveu continuar a escalada alegando que os dois eram escaladores experientes e que uma escalada de baixo de tempestade não era nada diante de tudo que eles enfrentaram juntos.
A visibilidade estava muito prejudicada. Possibilitando apenas Iuri enxergar um ponto laranja lutando para se manter junto a parede. Aquele ponto era seu amigo Jorge, que com muita coragem prosseguia diante de uma grossa rampa de gelo colocando algumas proteções apenas para evitar uma queda muito danosa. Cada golpe no gelo com seu piolet o direcionava para o vazio, lhe custando muita força.

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1 Comments:

Blogger gibara said...

Aow viado, num vai postar mais nessa birosca não?

Chega desses contos kilométricos que num dá tempo de ler hein!? HAHAHA

abraço

11:46 AM  

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